domingo, 4 de abril de 2010

Agressão verbal e humilhação são comuns entre jovens casais


Pesquisa aponta que 9 entre 10 adolescentes sofrem ou cometem violência contra parceiro

Ameaças e difamação tornam-se cada vez mais frequentes pelo celular e internet

Trocas de olhares, frio na barriga. suspiros. beijos e abraços calorosos. Carícias que, algumas vezes, terminam em relações sexuais. Eles vivem uma explosão hormonal: são adolescentes, cercados de impulsos típicos da idade. No entanto, a intensidade que marca o início dos romances é a mesma que provoca brigas memoráveis.

Com isso, histórias que deviam ser lembradas anos depois, algumas vezes, acabam sem finais felizes. Nove entre dez jovens que mantêm um relacionamento afetivo praticam ou sofrem variadas formas de violência. É o que aponta uma pesquisa do Centro Latino-Americano de Estudos de Violência e Saúde Jorge Careli, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).

A agressão verbal é o problema mais frequente entre moças e rapazes de 15 a 19 anos. Para o estudo, realizado entre agosto de 2007 e agosto de 2009, os pesquisadores entrevistaram 3.205 estudantes de dez capitais brasileiras, inclusive Belo Horizonte.

FOTO: FOTOS ALEXANDRE GUSANCHEMotivação. Ciúme é apontado como a principal causa das agressões verbais, segundo pesquisa

De acordo com uma das coordenadoras do estudo, a pesquisadora e doutora em Ciências da Saúde Kathie Njaine, mais de 2.700 estudantes, ou 85% deles, admitiram já ter dito aos parceiros coisas ruins em tom hostil, depreciações e xingamentos. Em igual proporção, eles relataram também já terem sido vítimas desse tipo de agressão. A maioria das vezes, motivada pelo ciúme. Algumas vezes, há agressão física.

A cuidadora de idosos, Juliana, 19, não imaginava o sofrimento que enfrentaria ao lado do namorado. A moradora da região de Venda Nova, em Belo Horizonte, conheceu Fernando, quando ambos tinham apenas 14 anos. "Foi amor à primeira vista. Nós só ficávamos grudados todo o tempo e fazíamos tudo juntos. Mas, um ano depois, o sonho acabou", revelou a jovem. Segundo Juliana, ela e o namorado começaram a brigar e as discussões ficaram piores.

A jovem conta que o namorado passou a humilhá-la e os dois se agrediam com tapas, socos e empurrões. O fim do namoro aconteceu recentemente, depois de cinco anos juntos. "Ele me chamava de gorda, mandava eu sumir da vida dele. Com isso, acabei engordando mais e minha autoestima foi abaixo do chão", contou.

De acordo com a pesquisadora da Fiocruz, o demérito à aparência física do parceiro foi uma forma explícita de violência verbal identificada na pesquisa . "Os meninos disseram que humilham as garotas chamando-as de gordas e feias. Como respostas a essas agressões, elas passaram a agredir mais, retrucando as ofensas", explicou Kathie.

Segundo ela, a o ato de "ficar", pode tomar proporções sérias. "As meninas contaram que em festas, os rapazes as puxam pelos cabelos ou as xingam se elas se negarem a ficar com eles, mas elas não perceberam essa atitude como um tipo de violência.

Na web. Durante os levantamentos, descobriu-se que os jovens estão fazendo ameaças e difamação do outro por meio da divulgação de fotos íntimas pelo celular ou via internet. A estratégia citada por eles é usada, muitas vezes, para tentar evitar o fim do namoro.

Os rapazes são os principais autores dessas chantagens. Existem casos de garotos que filmam a relação sexual com as namoradas sem que elas saibam da gravação.



Na escola

Religião não impede romance

A orientação religiosa não impediu o Colégio Santa Maria, localizado na região Leste da capital, de tentar acompanhar as mudanças dos tempos modernos. A escola católica permite o namoro no recreio, desde que os casais não extrapolem nas carícias. Beijos e abraços são permitidos.

Porém, para evitar algum tipo de problema com os enamorados, o diretor da instituição, o professor João Bernardes, disse tomar certos cuidados. "Assim que fico sabendo de um novo casal, chamo-o para conversar. Quero saber se os pais estão cientes desse relacionamento e, ainda assim, comunico o fato aos responsáveis", contou o diretor

.

De acordo com Bernardes, a medida estimula o diálogo em família. Assim, segundo ele, os pais podem orientar seus filhos conforme os próprios princípios. "Proibir não é a solução. O certo é darmos as orientações necessárias", explicou o diretor.

Ainda conforme Bernardes, embora haja a permissão do contato físico, ele orienta os alunos para não se excederem. "Pedimos sempre que o adolescente que namora tenha respeito consigo e com os demais colegas".

Há mais de 20 anos trabalhando na instituição, Bernardes disse não ter conhecimento de nenhum caso de agressão entre os jovens que namoram. "Nas disciplinas de filosofia, sociologia e educação religiosa, abordamos as questões de cidadania e valorização ao próximo", concluiu o diretor. (AS)



Educação

Pais são a referência afetiva

Adolescentes são mais vulneráveis por ainda estarem em formação

A funcionária pública Mirian de Lourdes França Machado, 50, e o marido, o aposentado Wiver Adair Machado, 53, sentem-se realizados em relação à criação dos dois filhos - um rapaz de 19 anos e uma jovem de 24, ambos universitários.

Miriam confessa ter enfrentado muitos medos e inseguranças, principalmente quando os filhos atingiram a adolescência. Mas, hoje, ela diz estar com a sensação de dever cumprido.

FOTO: CRISTIANO TRAD

"Educar os filhos não é uma tarefa fácil. Eu e meu marido consideramos que a base de tudo foram os diálogos e as orientações", disse Miriam. Na pesquisa da Fundação Oswaldo Cruz, os jovens entrevistados, independentemente do sexo e da condição social, elegeram a família, representada sobretudo pela figura dos pais, como a principal referência para questões afetivas e sexuais. A escola e a mídia também foram consideradas pelos adolescentes espaços importantes para a abordagem de assuntos relacionados a sexo e a drogas.

Em Belo Horizonte, o levantamento, com 400 alunos de dez escolas públicas e particulares, foi realizado pelo Núcleo de Promoção de Saúde e Paz - do Departamento de Medicina Preventiva e Social da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

De acordo com a coordenadora do núcleo, Elza Machado de Melo, a violência tem permeado mais as relações porque as normas e os valores na sociedade estão distorcidos. Para Elza, os mais novos, principalmente os adolescentes, são os mais vulneráveis à violência por se encontrarem em fase de formação.

"Por estar inserida em todos os campos da sociedade, a violência passou a ser incorporada pelos jovens como se ela fosse uma coisa normal", explica a professora.

Para o psicólogo Francisco José Machado Viana, especialista na área de atenção à violência, as boas regras de convivência estão sendo esquecidas. "Os homens, por si só, são agressivos. Como o tempo atual se marca pela competição e a falta de solidariedade, o comportamento agressivo tem mais chance de se desenvolver no indivíduo jovem", explica.

Expressão. Conforme Viana, esse comportamento compromete a vida das pessoas, principalmente dos adolescentes, que acabam fazendo da violência uma forma de comunicação. "A agressividade deles acaba refletindo nos relacionamentos afetivos".

O caminho para a prevenção do problema, segundo o psicólogo, é trabalhar todas as formas de violência dispostas na sociedade. "É preciso criar programas estratégicos de intervenções que contemplem diferentes aspectos das violências. Os trabalhos devem envolver os jovens para conscientizá-los sobre o que é certo e o que é errado", disse.



Necessário

Família e escola devem estabelecer diálogo

O contato físico entre adolescentes no Colégio Tiradentes, unidade Santa Tereza, região Leste da capital, é proibido. Mas, apesar de haver essa regra na instituição, existe a preocupação de manter os pais informados sobre o que acontece entre os estudantes, mesmo fora da escola. 
"Tudo que chega aos meus ouvidos de algum aluno é trabalhado diretamente com os pais. Os jovens precisam de amparo nessas horas", disse a capitão Lourdes Bernadete Marinho Santos, coordenadora de disciplina da instituição.

Na última terça-feira, a reportagem de O TEMPO conversou com a capitão e alguns estudantes. Embora não concordem com a proibição de namorar na escola, os adolescentes disseram respeitar as regras. Eles afirmaram que são comuns as brigas entre os casais, principalmente a troca de ofensas. Porém, negaram ocorrer qualquer tipo de agressão física.

"Somos uma escola com regimento militar, mas não estamos preparando os jovens para uma carreira, e sim, para uma vida em sociedade", explicou Lourdes. Ela orienta os estudantes a terem cuidados com a exposição e a autoestima. (AS)

Fonte: O Tempo.

Da redação do Plox

Vi no Plox

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